Laécio Beethoven - Vende-se Esca Casa 歌词

VENDE-SE ESTA CASA

Laécio Beethoven
I
Um verbo, dois pronomes mais um nome.
Então, quatro palavras na plaqueta.
Um hífen, "facultavelmente", some!
Fonemas ressonantes quão trombeta.
A pólvora de quinze letras tome,
Do cano da vergonha, da escopeta,
A causa de vendê-la. Pois consome,
Aquece com mistério na espoleta.
Permite que palavras de parede
Assaltem com leveza de outra rede,
O leito milenar das honrarias.
Martela todo prego, que fincava,
Na tábua desbocada, que berrava,
Do justo cidadão suas agonias.
II
"Arranha-céus", choupanas desprovidas,
Projetos de estrutura branda ou forte
Nas vielas ou gigantes avenidas,
Nos bairros de pequeno ou grande porte,
Arriscam, sem arreios, nem guaridas,
Passivos, à mercê da própria sorte,
"Comprantes" que prolonguem quase vidas,
Senão demolição: imprópria morte!
Anúncios em papéis classificados,
Letreiros de muralhas, desbotados,
Decretam das moradas a sentença:
"FULANO VENDE". Número do "cel."...
Mil voltas dê planeta carretel,
Parede tem ouvidos, fala, pensa.
III

A sala lembra cheiro matinal,
De "crote", dália, de chapéu-de-couro...
Imagens dos lençóis sobre o varal
Ativam lacrimais e trazem choro.
Fogão de lenha, "piúca" na cozinha,
Silêncio sucumbindo "cantiguinha"...
...Princesa preparava bom pirão...
A bela mais "beliz" mãe-genitora,
Refém da sina. Tina coletora
De mágoa que goteja da visão.
V
"Pingueira", poeira, contas de água e luz.
A porta se empenando risca o chão.
Tapume mofado, Bom Jesus...
Focando garatujas lê-se: pão,
Sabão, café, balão, papai, cuscuz...
Crianças, giz cera, mão, carvão...
- tão certo como sol no mar reluz -
Rabiscam logo possam. Conclusão:
Da frente ao fundo grafam breve história,
Outrora desenhada na memória,
Por hora, com penares, se desfaz.
O flandres do carrinho de brinquedo
E cofre desse seu maior segredo
É livro que molhou, rasgou-se. Jaz!
VI
Fazer seu ninho tal "Maria-Barreira"
É sina secular de um homem sano.
Carinho, sonho, ferro, pá, madeira,
Juntados a trabalho, meses, ano.
Retratos, móveis, filhos, companheira,
Amor eterno... Salve-me de engano,
O tempo mestre dá-lhe uma rasteira,
Despeja fel na língua do fulano.
Nos laços rubros põe-se a dar um nó.
O "VENDE-SE" já fala por si só!
Exceto a compra e venda por dinheiro,
Despreza logo, por força maior,
Escritos no invisível livro-mor,
Mil rezas e mil risos verdadeiros.
VII
Na Ponte Tal, foi "Jão-de-Deus" achado.
Por quê? Interrogado! Que motivo?
Loucura? Quebradeira? Apaixonado?
Favor descreva vil dispositivo.
Qual vento impulsionou voraz tornado?
De onde partiria tal incentivo?
Qual fogo devorou a flor do serrado
Herdeiro desse amor mais intensivo?
Gabolas compradores foram lá.
"Jão", sério, começou a resmungar
Mas resumiu na forma de poesia.
De lauda, certidão de casamento.
Em décimas, no verso:
Trovou com rimas métricas: .
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