Não queria o moleque com a faca na mão
ajoelhando o tio grisalho, querendo seu cartão
Queria só rimar choro de alegria
mas na favela não tem piscina, armário com comida
É só gambé gritando ''deita!'' pro mano de escopeta
que na fita do pagamento fuzilou o dono da empresa
O cuzão que não concorda com o holocausto brasileiro
vive no condomínio, limpa o rabo com dinheiro,
Quer o sangue do ladrão, bebendo o seu uísque
protegido na ilusão da grade da suíte
Sua paz tá no luto decretado pelo tráfico,
o comércio fechado tipo feriado
Tá na bala perdida do fuzil varando sua porta,
explodindo teu mundo rosa, te pondo na cadeira de rodas,
na gravação do circuito interno do Bradesco
roubo a bando querendo um enterro, ladrão trocando pra não ser preso
No céu não tem deus, só o helicóptero da polícia
descarregando uma traca no fugitivo da delegacia
Aqui o Corujão só passa bang bang
no fim do arco-íris o dono do jato vomita sangue
Leva vigia, colete e blindagem pra ir pro restaurante
senão é viúva chorando e Ômega zero no desmanche
Não vou rimar felicidade no meu rap,
se aqui, filho da puta, a marcha fúnebre prossegue
A paz tá morta, desfigurada no IML
A marcha fúnebre prossegue
Tá rindo, quer dançar, quer se divertir?
Meu relato é sanguinário, playboy não vai curtir
Sou homem pra falar que o moleque do pipa
esquecido um dia troca tiro com a polícia
Não simulo sentimento pra vender CD
não vou falar de paz vendo a vítima morrer,
Dendo no DP o mano cumprindo pena,
matando o seguro pra ter transferência
Vendo a criança no Norte comendo cacto,
o gambé desovando mais um corpo no mato
Não iludo o casal dirigindo feliz à pampa
fora da blindagem é um sonho a segurança
Quando o portão automático da goma subir,
prepare a senha do cofre pro ladrão abrir
Que deus deixe ele encontrar, madame, sua esmeralda
senão ele arranca seu coração na faca
A polícia vai chegar só pra fazer perícia
quando alguém se incomodar com o cheiro de carniça
No balcão uma com limão pra esquecer o desemprego
e bater na mulher quando chegar a noite bêbado
Desde às 4 da manhã e nem vaga pra lavar privada
o mano perde a calma, mata a família e se mata
Caixão lacrado não estimula verso alegre
aqui, filho da puta, a marcha fúnebre prossegue
A paz tá morta, desfigurada no IML
A marcha fúnebre prossegue
Queria que a vida fosse igual na novela:
jet ski na praia, esqui na neve europeia
Sem pai de família gritando assalto
ou sendo feito de escravo com 151 por mês de salário
Que não enche nem metade de um carrinho no mercado,
não paga a luz e água, o aluguel do barraco
Aqui pro cidadão honesto ter um teto
só pondo o fogão na cabeça e invadindo o prédio
Saindo na mão com o PM do Choque,
sobreviver do tiro da reintegração de posse
Pergunta pro tio do terreno invadido no escuro
o que é um trator transformando tua goma em entulho
Arrombado que me critica, me mostre o povo sorrindo
de carro, casa própria, churrasco no domingo
Será que é miragem o mendigo que come osso,
gambé porco que pela tua cor deforma seu rosto?
O menino com a 380 que rouba o carro e dá fuga
deixando a burguesa mutilada sem metade da nuca?
Quem vê violência só na tela da TV
só vai ouvir Facção e conseguir entender
quando tiver amarrado dentro do porta mala
rezando pro ladrão não enfiar bala
Quando trombar a dor, vai enxergar o verdadeiro rap
o filho da puta vai sentir que a marcha fúnebre prossegue
A paz tá morta, desfigurada no IML
A marcha fúnebre prossegue