Ainda sobre a dor
Seqüelas falam por mim
As chamas falsas que tentaram me consumir
Hoje são apenas cinzas
Em uma guerra de palavras mórbidas
Que tentavam chegar aos céus
Algo me levou ao abismo
Congelaram minhas artérias
Enquanto em obediência eu descia
Numa terra morta e sem chão
Onde o medo era lei
Eu vi corpos sendo arrastados
Corações sendo vendidos
Meus ouvidos confusos
Pois gritavam coisas sem compreensão
No meio de um povo sofrido
Não se sabia o que era humano ou animal
Eu era um estranho diante das faces
As bestas sem alma me olhavam desconfiadas
Tentavam me sondar
Procuravam um ar de medo
Mas meu corpo estava fechado
Palavra nenhuma saía de mim
Uma voz de poder vociferava
Mas apenas eu podia ouvir
Dizia-me onde eu devia pisar
Onde eu podia ver
As bestas sem alma se enfureceram
De longe tentavam me cegar
Pois não podiam tocar em mim
Decapitavam os indefesos
Faziam gargarejo com sangue inocente
E logo blasfemavam contra os céus
O sangue quente escorria
Alimentava um rio de dor
Agora eram as pedras que falavam
Em conflito com o vento que ali soprava
Depois disso eu vi o curso do mal
Aquele rio que parecia não ter fim
Passava por trás da casa do maligno
O sangue dos inocentes o alimentava
A fonte de seu poder vinha da escravidão
A voz que vociferava em mim
Agora me dizia pra seguir
Invada aquela casa
Derrube os portões
Quem tentar enxergar cores em você
Terá seus olhos caídos sobre a terra
Já não sentia meus pés
Nem ouvia mais a voz
Dessa vez apenas os olhos e a alma enxergavam
Diante da luz negra
Sem saber o que é coragem ou medo
Artérias congeladas novamente
De frente a um espelho
Vi um corpo imóvel do outro lado
Rodeado por sombras frias
Me olhando fixamente
Meu sangue começou a correr
E a voz voltou a me falar
Este é o seu inverso
É ele quem carrega a chave dessa terra
É ele quem levou embora o chão
E trancou as almas no abismo
Seus olhos caíram diante de mim
Foram esmagados por seus próprios pés
O céu foi desabando aos poucos
Enquanto a terra morta
Engolia as bestas sem alma
Os corações voltaram a bater
E o rio de dor se secou
Eu apenas saltei do abismo
E a carruagem de fogo me levava
E a voz que me fez enxergar essas coisas
Continua vociferando dentro de mim
Ela me deu a chave do abismo
Eu luto contra mim mesmo
Para que aquela terra não seja mais habitada
E o sangue puro não corra em vão