Saudaste as gotas do Inverno
espreitaste sonhos pelas frestas
sentaste-te à sombra do deserto
à espera que a angústia se vá
Voltaste a página do livro
sem vigiar o dormir dela
voltaste a cheirar a queimada
dum pinheiral que a chuva lavra
Tirano, Tirano coração
Meu amor já foi embora
com a buzina dos navios
como é tenro o pão de trigo
e dura a curva da vida
Abriste o olhar das colinas
imaginaste outras venturas
ouviste o pulsar dos telhados
numa portada sobre o rio
E quando o silêncio inunda
vai repousar sobre estendais
abre as ombreiras da janela
ao respirar dos aventais
E numa noite assim deitado
senti o cais com o céu estrelado
revi-me em becos da cidade
e nos eléctricos, largado
E há sons cruzados na praça
mais as conversas de café
as discussões e as chalaças
entre dois copos de água pé
Tirano, Tirano coração
Já perdi o meu sorriso
em promessas enganadas
um tempo que foi perdido
em águas mudas passadas
O brilho dos écrans para consolar
na jarra uma flor por libertar