Foi cunhã que me viu lá na beira
Foi cunhã a que me fez boiar
Foi cunhã na manhã derradeira
Cunhatã a que me fez voltar
Arrepio no meião do rio
Arrebol fez rajada no ar
Ela passa e eu desconfio
Que o mundo está quase a tornar
De ponta a cabeça, desvario
A caminho de acabar
Foi cunhã, vi descer a ladeira
Foi cunhã, para a beira lavar
Desconjuro no fundo do furo
Desnorteio buscando no ar
Desgraçada aventureira
Que me veio amaldiçoar
Não troço mais graça alvissareira
Nem vou mais malinar
Foi cunhã do alto da ribanceira
Foi cunhã meu caminho cruzar
Foi cunhã feito flecha certeira
Cunhatã nunca mais vou tocar
Fez feitiço pra me dar sumiço
Arapuca pra quando eu passar
Eu pra sempre serei bicho:
Não posso mais gente virar
Caminho de boto é descaminho
Nas águas do Andirá
Noite de maré cheia
De estrela a nos alumiar
Toda gente se arrodeia
Querendo engerado me olhar
Não faço nem mal a ninguém
Não tem mais quem queira me amar
Não troço mais graça alvissareira
Nem vou mais malinar
Foi cunhã, minha alma festeira
Foi cunhã, mal olhado lançar
Foi cunhã, feito cobra rasteira
Cunhatã quis me escorraçar
Meia noite no breu um açoite
Lua cheia que Deus fez sumir
Serpenteia, rara noite,
A modo de me redimir
Ó, minha mãe d'água milagreira
Me faça guerreiro resistir
À vingança de cunhã
Que, prometo, nunca procurei
Feito cego em frente ao sol
Sou peixe no seu anzol
Mas eu mesmo me pesquei
Quando dei confiança pra cunhã
Inventei um fim pra mim