Me chamam a delicada
Que eu sou milonga de agora
Não durmo sobre os arreio
E nem grito campo a fora
A delicada me dizem
Porque eu não afio espora
Me chamam a delicada
Porque eu não canto façanha
Não tomo golpe nos queixos
Tampouco gole de canha
E não uso corda forte
Pra amigo que me acompanha
Mas, delicada é a vertente
No fundo de uma invernada
É um pé da laranja guaxa
Que adoça a volta de estrada
Chuva pintando de bronze
Uma tropilha gateada
Quietude de rancherio
Ao sol de fim de semana
Senhora cevando o mate
Em caneca de porcelana
Pra depois secar a erva
Para la otra mañana
Delicada é a melodia
Que eu ouço na sanga rasa
E é a artéria que pulsa
Numa coronilha em brasa
É a graça da moça pobre
Com roupa de andar em casa
Eu sou a flor destes campos
E a flor dos arrabaldes
Do porto de Buenos Aires
Dos bolichos das cidades
Do dialeto de bordona
Que firmo minha identidade
Se rude ou se delicada
A trança não arrebenta
Quanto mais parelho o tento
Mais tironaço ela aguenta
Igual milonga do sul
Delicada e violenta
Sergio Carvalho Pereira