José Pacheco - A Chegada de Lampião No Inferno Songtexte
Um cabra de lampião
Por nome pilão deitado
Que morreu numa trincheira
Um certo tempo passado
Agora pelo sertão
Anda correndo visão
Fazendo mal assombra
Foi ele que trouxe a noticia
Que viu lampião chegar
O inferno nesse dia
Faltou pouco pra virar
Incendiou-se o mercado
Morreu tanto cão queimado
Que faz pena até contar
Morreu mãe de canguinha
O pai de forrobodó
Cem netos de parafuso
Um cão chamado cotó
Escapuliu boca ensossa
E uma moleca ainda moça
Quase queima o totó
Morreram cem negros velhos
Que não trabalhavam mais
Um cão chamado traz cá
Vira volta e capataz
Tromba suja e bigodeira
Um cão chamado goteira
Cunhado de satanás
Vamos tratar na chegada
Quando lampião bateu
Um moleque ainda moço
No portão apareceu
Quem o senhor cavalheiro
Moleque eu sou cangaceiro
Lampião lhe respondeu
O moleque não sou vigia
E não sou seu pareceiro
E você aqui não entra
Sem dizer quem é primeiro
Moleque abra o portão
Saiba que sou lampião
O assombro do mundo inteiro
Então esse vigia
Que trabalha no portão
Dá pisa que voa cinza
Sem fazer distinção
O cabra escreveu não leu
A macaiba comeu
Ali não se faz perdão
O vigia disse assim
Fique fora que eu entro
Vou falar com o chefe
No gabinete do centro
Por certo ele não lhe quer
Mais conforme o que disser
Eu levo o senhor prá dentro
Lampião disse vá logo
Quem conversa perde hora
Vá depressa e volte já
Que eu quero pouca demora
Se não me derem ingresso
Eu viro tudo asavesso
Tóco fogo e vou embora
O vigia foi e disse
A satanás no salão
Saiba vossa senhoria
Que aí chegou lampião
Dizendo que quer entrar
Eu vim lhe perguntar
Se dou-lhe ingresso ou não
Não senhor satanás disse
Vá dizer que vá embora
Só me chega gente ruim
Eu ando meio caipora
Eu já estou com vontade
De botar mais da metade
Dos que têm aqui pra fora
Lampião é um bandido
Ladrão da honestidade
Só vêm desmoralizar
Nossa propriedade
E eu não vou procurar
Sarna pra me coçar
Sem haver necessidade
Disse e vigia patrão
A coisa vai esquentar
Eu que ele vai se danar
Quando não puder entrar
Satanás disse é nada
Convida aí a negrada
E leve o que precisar
Leve cem dúzias de negros
Entre homem e mulher
Vá na loja de ferragens
Tire as armas que quiser
É bom avisar também
Pra vir os negros que tem
Mais compadre lucifer
E reuniu-se a negrada
Primeiro chegou fuchico
Com um bacamarte veio
Gritando por cão de bico
Que trouxesse o pau da prensa
E fosse chamar tangença
Na casa de maçarico
E depois chegou cambota
Endireitando o boné
Formigueiro e trupe zupe
E o crioulo quelé
Chegou caé e pacaia
Rabisca e cordão de saia
E foram chamar banzé
Veio uma diaba moça
Com uma caçola de meia
Puxou a vara da cerca
Dizendo a coisa tá feia
Hoje e negocio se dana
E gritou eita banana
Agora a ripa vadeia
E saiu a tropa armada
Em direção ao terreiro
Com faca facão e pistola
Canivete e granadeiro
Uma negra também vinha
Com a trempe da cozinha
E o pau de bater tempero
Quando lampião deu fé
Da tropa negra encostada
Disse só na abissínia
Dá tropa preta danada
O chefe do batalhão
Gritou de arma na mão
Toca-lhe fogo negrada
Nessa voz ouviu-se tiro
Que só pipoca no caco
Lampião pulava tanto
Que parecia um macaco
Tinha um negro nesse meio
Que brigou tomando tabaco
Acabou-se o tiroteio
Por falta de munição
Mas o cacete batia
Nego rolava no chão
Pau pedra que achavam
E tudo que a mão pegava
Sacudiam em lampião
Chega trás um armamento
Assim gritava o vigia
Trás a pá de mexer doce
Lasca os gamos de caria
Trás um birro de massau
Corre vai buscar um pau
Na cerca da padaria
Lucifer mais satanás
Vieram olhar do terraço
Todos contra lampião
De cacete vaca e braço
O comandante no grito
Dizia briga bonito
Negrada chega-lhe o aço
Lampião pode apanhar
Uma caveira de boi
E sacudiu na testa dum
E ele só fez dizer oi
Ainda correu dez braças
E caiu enchendo a calça
Mais não digo de que foi
Estava travada a luta
Mais de uma hora fazia
A poeira cobria tudo
Negro embolava e gemia
Porem lampião ferido
Ainda não tinha caído
Devido a grande energia
Lampião pegou um seixo
E rebateu em um cão
Mas o qual arrebentou
A vidraça do oitão
Saiu um fogo azulado
Incendiou o mercado
E o armazém de algodão
Satanás com este incêndio
Tocou no búzio chamando
Correram todos os negros
Que se encontravam brigando
Lampião pegou a olhar
Não vendo com quem brigar
Também foi se retirando
Houve grande prejuízo
No inferno nesse dia
Queimou-se todo dinheiro
Que satanás possuía
Queimou-se o livro de ponto
Perdeu-se vinte mil contos
Somente em mercadoria
Reclamava lucifer
Horror maior não precisa
Os anos ruim de safra
E agora mais esta pisa
Se não houver bom inverno
Tão cedo aqui no inferno
Ninguem compra uma camisa
Leitores vou terminar
O tratado de lampião
Muito embora que não possa
Vos dá maiores explicação
No inferno não ficou
No céu também não chegou
Por certo está no sertão
Quem duvidar desta historia
Pensar que não foi assim
Querer zombar do meu eu
Não acreditando em mim
Vá comprar papel moderno
E escreva paro o inferno
Mande saber de caim